maio 28, 2020 14:22
Evelyn de Britto Dutra
O trabalho em saúde é marcado por relações interpessoais, que trazem uma imprevisibilidade no resultado final. O trabalho é fruto da interação entre o pessoal e o profissional, permeado por inúmeras variáveis. Mesmo que o profissional direcione seu trabalho conforme suas especificidades, existirá um fator de incerteza relacionado ao resultado do serviço. A complexidade envolvida nos processos de prestação de serviço em saúde mostra a necessidade de novos modos de trabalho em saúde para o contexto moderno, dispondo de um caráter mais integrativo e comunicativo (COSTA et al. 2018).
Para promover novas formas de trabalho, a colaboração sugere ser um potencial interessante, quando não fundamental, na organização do universo formativo, bem como na própria prática profissional. Para resolver problemas complexos, como costumeiramente são os casos na saúde, muitas vezes necessita-se de uma combinação de habilidades e diversidade de conhecimentos que só são obtidas na prática interprofissional concretizada através da modalidade de trabalho em equipe.
Frente a essa nova organização de trabalho, que demanda maior integração, a Organização Mundial da Saúde publicou um relatório incentivando ações no âmbito da educação interprofissinal e prática colaborativa, o qual descreve:
Prática colaborativa na atenção à saúde ocorre quando profissionais de saúde de diferentes áreas prestam serviços com base na integralidade da saúde, envolvendo os pacientes e suas famílias, cuidadores e comunidades para atenção à saúde da mais alta qualidade em todos os níveis da rede de serviços (WHO, 2010).
Pode-se destacar três elementos centrais nesse conceito: (i) a prática interprofissional, quando enuncia a interação de diferentes profissionais visando à integralidade; (ii) o cuidado centrado no usuário, quando inclui o paciente, a família e a comunidade no processo de responsabilização pela sua saúde; e (iii) a Rede de Atenção à Saúde (RAS), quando destaca a prática em todos os níveis de atenção.
Para o conceito de prática interprofissional, utiliza-se o ideal de equipe integração definida por Peduzzi (2001), que parte da articulação entre os membros de acordo com a proposta da integralidade das ações de saúde guiados pela forte relação de Atenção Centrada no Paciente (D’AMOUR et al., 2008).
Essa abordagem considera o indivíduo em sua singularidade, cujas suas necessidades estão no centro dos cuidados de saúde, definido como “processo de parceria ou coprodução entre profissionais e usuários para o planejamento, desenvolvimento e avaliação do cuidado, apropriado às necessidades de saúde com respeito às preferências, valores, situação familiar, condição social e estilo de vida” (SILVA, 2014). A busca pelo cuidado deve ser com as pessoas, no lugar do cuidado para as pessoas (DOMAJNKO et al., 2015).
Agreli, Peduzzi e Silva (2016) revelam no seu estudo que a Atenção Centrada no Paciente pode ser compreendida a partir de três elementos: perspectiva ampliada do cuidado à saúde, participação do paciente no cuidado e relação profissional e paciente. O primeiro se fundamenta na visão holística, que reconhece a complexidade das necessidades de saúde e da organização dos serviços. O segundo elemento evidencia a importância do autocuidado e da autonomia no processo tão singular como é o de cuidado, que precisa estimular a participação do usuário e família. Por último, apresenta as relações de poder envolvidas nessas interações e a construção de vínculos e confiança como condições fundamentais na qualidade da atenção.
Mesmo que haja a interprofissionalidade na equipe, a prática colaborativa não se restringe ao trabalho de uma única equipe, ela prevê a articulação entre equipes de diferentes serviços de saúde na rede de atenção (SILVA, 2014). Para existir esta articulação, a organização dos serviços de saúde precisa ser vinculada entre si por objetivos comuns e por uma ação cooperativa e interdependente com o intuito de oferecer uma atenção contínua e integral a determinada população, coordenada pela Atenção Básica (MENDES, 2011).
Sabe-se que estimular o trabalho em saúde nos moldes de uma Prática Colaborativa, reflete em serviços de saúde com melhor qualidade, porém, a operacionalização dessa prática se apresenta como um desafio com iniciativas ainda incipientes no país (PEDUZZI; AGRELI, 2018). A complexidade da Prática Colaborativa exige mais empenho e mecanismo de articulação que extrapola a formação de uma “equipe integração”, traçando um modelo de trabalho em rede e intersetorial.
REFERÊNCIAS
AGRELI, H.F. PEDUZZI M. SILVA, M.C. Patient centred care in interprofessional collaborative practice. Interface (Botucatu), 20(59):905-16, 2016.
COSTA, et al. Educação Interprofissional em Saúde. Natal: SEDIS-UFRN, 2018.
D’AMOUR, D. et al. A model and typology of collaboration between professionals in healthcare organizations. BMC Health Serv Res. 2008; 8:188. https://bmchealthservres.biomedcentral.com/articles/10.1186/1472-6963-8-188
DOMAJNKO, Barbara et al. Beyond interprofessionalism: caring together with rather than for people. In: VYT, Andre; PAHOR, Majda; TERVASKANTO-MAENTAUSTA, Tiina. Interprofessional education In Europe: policy and practice. Antwerpen/Apeldoorn: Garant; pp. 37-48, 2015.
MENDES, E. V. As redes de atenção à saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2011.
PEDUZZI, M. Equipe multiprofissional de saúde: conceito e tipologia. Rev. Saúde Pública; v. 35, n1, pp.103-9, 2001.
PEDUZZI, Marina; AGRELI, Heloise Fernandes. Trabalho em equipe e prática colaborativa na Atenção Primária à Saúde. Interface (Botucatu), Botucatu, v. 22, supl. 2, p. 15251534, 2018. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141432832018000601525&lng=pt&nrm=iso. Acesso em 19 jun. 2019.
SILVA, J. A. M. Educação Interprofissional em Saúde e Enfermagem no Contexto da Atenção Primária. Tese de doutorado (Doutorado em Ciências), São Paulo, 2014.
WHO – World Health Organization. Framework for action on interprofessional education & collaborative practice. Geneva: WHO, 2010.
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